Hora Marcada recebe advogada criminalista para falar sobre abuso de vulnerável
- Rádio Tupanci
- 28 de out.
- 5 min de leitura
Entrevista com a especialista em processo penal Ingrid Ziebell abordou o crime de abuso sexual de vulneráveis, tema que tem repercutido em notícias recentes.
Por Maria Eduarda Lopes

O programa Hora Marcada apresentado pelo jornalista Sérgio Corrêa, recebeu, na manhã de sexta-feira (24), a advogada criminalista Ingrid Ziebell, para discutir questões relacionadas ao crime de abuso sexual de vulneráveis.
Ingrid é formada em Direito pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e pós-graduada em Direito Processual Penal pela Damásio Educacional. É sócia fundadora do Escritório Ziebell Advocacia Criminal Especializada, localizado em Pelotas. Além disso, integra a Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (ABRACRIM), e participa da Comissão Nacional de Execução Penal. Integra ainda a Comissão de Segurança Pública da Associação Brasileira de Mulheres da Carreira Jurídica de Pelotas e atua como secretária da Comissão Estadual de Abuso de Autoridade da ABRACRIM-RS. Também é conselheira do Conselho da Comunidade de Execução Penal de Pelotas representando a UFPel.
Crime de estupro atinge recorde no Brasil
O estupro de vulnerável está presente na lei através do Artigo 217-A do Código Penal, que criminaliza a conjunção carnal ou a prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, com pena de reclusão de 8 a 15 anos, podendo aumentar conforme as qualificações do caso.
Dados da 19ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), revelam que o Brasil registrou 87.545 vítimas de estupro e estupro de vulnerável em 2024, representando o maior número da série histórica iniciada em 2011. A maior parte dos casos (76,8%) corresponde ao estupro de vulnerável, sendo 61,3% das vítimas com até 13 anos de idade, com a faixa etária de 10 a 13 anos concentrando o maior volume de casos.
O levantamento também indica que a violência sexual é majoritariamente intrafamiliar. De acordo com o estudo, 65,7% dos estupros registrados ocorreram na residência da vítima. Entre os agressores, 45,5% eram familiares e 20,3% eram parceiros ou ex-parceiros íntimos.
Seis dos dez estados com maiores taxas de violência sexual contra crianças e adolescentes estão na Amazônia. Um estudo conjunto do UNICEF e do FBSP aponta que, entre 2021 e 2023, foram registrados mais de 31 mil casos de estupros de vítimas com até 19 anos.
Casos recentes repercutem na mídia
Em setembro deste ano, o humorista gaúcho Cristiano Pereira foi condenado a 18 anos de prisçao em regime fechado pelo crime de estupro de vulnerável, conforme decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS). O crime teria ocorrido em 2021, quando a vítima tinha 3 ou 4 anos. O caso, embora tramite sob segredo de justiça, ganhou repercussão nas redes sociais através da imprensa e gerou grande indignação pública. A defesa do humorista informou que ele havia sido absolvido em primeira instância, sob alegação de ausência de provas e autoria, e que a decisão de segunda instância contradiz laudos periciais iniciais.
Outro caso recente ocorreu em Pelotas, na última quarta-feira (23), quando o ex-vereador Roger Ney foi preso preventivamente pela Delegacia da Criança e do Adolescente (DPCA), suspeito de estupro de vulnerável. A vítima teria 10 anos. De acordo com a Polícia Civil, as investigações foram concluídas e encaminhadas ao Ministério Público (MP) e ao Poder Judiciário. O ex-vereador foi levado ao Presídio Regional de Pelotas, onde permanece à disposição da Justiça. A defesa informou que irá recorrer da decisão que manteve a prisão preventiva e não se manifestará sobre o caso, que tramita sob sigilo.
Entrevista no programa Hora Marcada
Durante a entrevista, a advogada Ingrid Ziebell ressaltou a importância de analisar com atenção as acusações antes de qualquer manifestação da defesa. “É muito importante ler a acusação e a investigação, não podemos fazer nada sem antes ver o que está no papel”.
Em situações de flagrante, Ingrid destacou como se torna necessário manter a calma, ter inteligência emocional e manter a postura profissional. “O advogado pode ser ao mesmo tempo incisivo e assertivo no exercício da sua profissão, mas não precisa ser grosseiro e beligerante. Conseguimos o mesmo resultado, ou até melhor, chegando com calma e educação nos cenarios”.
Questionada por um ouvinte sobre a banalização do Artigo 217-A, a advogada explicou que, até 2009, crimes de atentado violento ao pudor e estupro eram distintos. O primeiro era relacionado a atos libidinosos que não envolviam o ato sexual em si. Com a Lei nº 12.015/2009, as duas condutas foram unificadas.
Em meio essa discussão, surge a necessidade do cuidado ético e da responsabilidade da imprensa ao divulgar casos do tipo, podendo atrair uma reação natural e instintiva da sociedade na proteção da infância. Segundo a advogada, quando a denúncia é feita, em primeiro momento o procedimento padrão é registrar a ocorrência, não existindo juízo pretérito anterior.
A especialista também abordou situações de alienação parental nas quais surgem denúncias de abuso, destacando o impacto emocional sobre as crianças envolvidas: “No fim, quem fica desprotegido em tudo isso é a criança, em um contexto onde não há segurança de nenhum dos lados”.
Conforme explicação, as principais provas nesses casos são os depoimentos e perícias psicológicas. Ela ainda observou uma dificuldade maior em detectar abusos cometidos contra meninos: “Os meninos são muito mais compelidos, por uma questão estrutural da sociedade, a não contar, porque atinge sua masculinidade ao relatar que foi abusado, submetido a qualquer tipo de violência, violação ou constrangimento”.
Durante o programa, outro ouvinte a questionou sobre o andamento do caso do humorista Cristiano Pereira: “Temos uma vedação ético profissional de comentar sobre casos em andamento, além de não ter acesso aos documentos. Inclusive, é crime divulgar partes desse processo. Quando temos uma pessoa pública, que está sofrendo esse processo, é complicado fazer manifestações, é preciso ter cuidado com o que veiculamos, até mesmo para não expor a vítima”.
Por fim, a advogada reforçou a importância da denúncia. Ela relatou que ao longo de sua carreira já recebeu mulheres que sofreram algum tipo de abuso durante a infância, e na vida adulta se sentiram prontas para denunciar. De acordo com sua explicação, o prazo de prescrição do crime de estupro de vulnerável começa a contar quando a vítima completa 18 anos, com prescrição de 20 anos. Entretanto, só vale para crimes cometidos a partir de 2009.
“São crimes que acontecem todos os dias, e com frequência cada vez maior”, conclui.
Canais de denúncia
Para realizar denúncias, ligue 180 para a Central de Atendimento à Mulher. Em Pelotas, as denúncias podem ser feitas presencialmente na Delegacia de Pronto Atendimento, localizada na Rua Prof. Dr. Araújo, 900, ou na Delegacia da Criança e do Adolescente (DPCA), na Rua Padre Anchieta, 3056, que também atende por meio do telefone (53) 3225-4567.
📻 Confira a entrevista completa no canal da Rádio Tupanci no YouTube.





Comentários